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Monday, August 17, 2009

Sobre matrecos: possibilidades e impossibilidades de uma identidade

Sobre matrecos: possibilidades e impossibilidades de uma identidade

  • Uma pretenciosa reflexão “filosófica” sobre a obra Falas Impossíveis de Amarildo Valeriano


Gerson Geraldo Machevo

Para Sánia Mariza Matusse


A poesia é sempre vista como bebida de resmungões e desiludidos durante anos, (desculpem-me os poetas por esta afirmação), sempre os poetas falam de coisas que não percebemos, movem-se entre metáforas e hipérboles em todas as direcções. Por essas razões entre pensadores tão originais como Platão ouviu-se dizer mal da poesia, pois ela aliena o homem, aliena a existência e inventa mundos utópicos. Mas no meio de tanta bebedeira e tropeços alguns poetas conseguiram expressar a alma do seu povo e até algumas vezes a sua própria alma, razão pela qual algumas pessoas preferem sempre aos poetas que aos filósofos.

Poesia é loucura e filosofia é sabedoria, assim definiram alguns iluministas, a emoção pertencia aos seres minorizados enquanto que a razão pertencia a seres iluminados. Esta oposição constante entre pensamentos e emoções, entre consciência e demência, e entre a imaginação e o concreto fez com que o Ludwig WIttgenstein declarasse que “do que se não falar, é melhor calar-se”, ou por outra, sobre o que é impossível dizer-se o possível é não dizer nada!

Já antes disse que o Sr. Valeriano empenhou-se na busca de uma ambição pouco filosófica e pouco racional, porque como falaria ele do impossível, o que ele poderia nos dizer com essas falas impossíveis (mas possíveis ao seu ver). A sua obra por mais que pareça mais um daqueles goles de ilusão, ainda aparenta algumas semelhanças com a realidade. Ora se de contrário pelo menos o seu anseio em expressar a realidade com falas poéticas, procura apresentar-nos algumas verdades.

Depois de algum tempo de reflexão apercebi-me de algo que George Berkeley disse a três séculos atrás, “só existimos quando somos percebidos”, e não apenas quando pensamos (como defendia Descartes) ou sofremos a angústia (Sartre). As falas impossíveis de Amarildo Valeriano são uma tentativa de afirmação uma possível identidade e uma cosmovisão pertencentes à um sujeito em busca de uma auto-compreensão. Como ele afirma no poema Descorte:

Eis a diferença

Como se o ser

Mais é

O que foi,

A poesia de Amarildo Valeriano é essa confiança de uma afirmação identitária de um ser cosmopolita, de um ser solitário, globalizado e localizado numa realidade onde os seus ideais repousam em ideias sobre um mundo impossível/possível. Como ele chega a afirmar no poema Liberdade em tom maior “choramos quando nascemos mas ninguém ousa perguntar porque viemos!”. A identidade possível na poesia de Amarildo é uma fala impossível, indizível e impronunciável, mas imaginável.

O jogo desenhado entre o passado, o presente e o futuro nas falas valerianas fazem-me repensar na ideia escondida por trás das palavras do valeriano, o homem contemporâneo é uma identidade matreca, pois, “está na moda ser matreco”. A crítica que ele desenha a sociedade actual representa para além da busca de uma identidade individual o sentimento de uma colectividade de seres sem vozes, sem falas, mas que sentem-se desorientados num mundo quase comum num universo incomum. Há um sentimento de revolta e de construção identitária que carece de alguma profundidade (navegação que me proponho a fazer futuramente, porque é um empreedimento filosófico).

Por fim, podemos dizer uma racionalidade oculta nas frases bêbadas/emocionais do poeta Valeriano, uma racionalidade emocional que nos convida a uma procura interna de nós mesmos. Existem sentenças projectivas que se relacionam com o quotidiano de todos nós. A vontade de um poder ilimitado de acabar com a injustiça. Como ele afirma:

Mas eu gosto de certos poetas

Que sem compromissos nem complexos

Não temem em dizer a verdade

Tal como ela é;


Licenciado em Ensino de Filosofia

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